terça-feira, 26 de maio de 2015

Povo sem história não é povo, é bando


Capa de abertura da matéria da Revista National GEO de agosto de 2014.
O sítio, ou o prédio histórico, isolada ou integrada, nos dá uma medida de desenvolvimento mental de um homem ou de uma sociedade, em um determinado local, em relação a si próprio ou em relação ao conjunto cultural humano em todos os quadrantes da terra, nos dando também dimensão de suas necessidades.
O resgate do patrimônio histórico, não raro, nos oferta conclusões de suma valia para a orientação e comportamento do homem, notadamente por que uma das conclusões extraídas desse resgate nos revela naturalmente que os ciclos históricos se repetem com alguma exatidão e as atitudes dos homens, em determinadas circunstâncias, são sempre as mesmas. Daí entendemos ser história uma fonte inesgotável de exemplos de vivência e convivência.
Enchente do Rio Madeira em 2014 - pátio da Madeira Mamoré - PVH
O resgate da história, como se vê, culmina por fincar balizas num campo não conhecido pelo homem, amparando-se com informações que lhe permitam, senão um caminho seguro, pelo menos algumas alternativas de procedimento, arredando aquelas comprovadamente nefastas. E assim, conhecendo o passado, desvendando o futuro.
Assim, não temos outro modo de viver. Somos impelidos cada vez mais a procurarmos por nós mesmos, através do véu do tempo. Exemplificados pelas dificuldades modernas de estudarmos o passado, temos o compromisso moral de mantermos em pé o nosso presente para que nossos sucessores não passem pelas aflitivas situações com que temos nos deparado.
Aleks Palitot na Ponte Lajes próximo a Vila Murtinho em Nova Mamoré
Nota-se que o estudo da história é uma tarefa superior. Por isso, a necessidade do curso de bacharelado em história pois, ele possibilita munir o historiador de ferramentas, métodos e experiência. O historiador com diploma e não o de “gaveta” é, por assim dizer, uma versão do guardião do tesouro, o responsável em possibilitar a formação de massa crítica na sociedade. A tarefa não admite a colaboração de ímpios, aliás, exatamente aqueles que pelas mais variadas razões tratam de ir apagando seus rastos ou indícios de seus inimigos. O historiador tem de ser antes de tudo imparcial, capaz de atravessar a rede de ciúmes e ódios, vaidades e ambições, tão comum aos homens.
No caso de Rondônia, o espetacular Forte Príncipe da Beira, mais do que uma breve história militar portuguesa nas selvas amazônicas, nos revela, no conjunto das edificações militares que começam com o Forte Jesus Maria José, no Rio Grande do Sul, e terminam com o Forte Macapá, a história de uma geopolítica traçada pelo Marquês de Pombal, de dominação portuguesa em regiões de disputa com a coroa espanhola.
Estação Ferroviária de Guajará Mirim em Rondônia - 2012
 A importância do historiador e da pesquisa na defesa do patrimônio e na sua preservação, é pois, uma colocação tão contundente que se torna axiomática; ou seja: não há quem não lhe possa avaliar o valor.
Prefiro, quando vivo numa comunidade como a nossa, lembrar da importância que temos, todos nós, transmutados em historiadores, de defendermos e preservarmos aquilo que hoje está se desintegrando entre nossos olhos, como um delito à nossa consciência de homens civilizados. Sorte a nossa que ainda temos pessoas que lutam por nossa memória, estes por alguns são “personas no gratas”, para outros defensores da nossa história e por isso, será válido frisar pessoas como a historiadora Yeda Borzacov, o historiador Marco Teixeira, o acadêmico de arqueologia Manuel Português, o museólogo Ocampo Fernandes e o arquiteto Luiz Leite.
Ponte de Jacy Paraná - Estrada de Ferro M.M.
O mais atual e importante patrimônio histórico que temos, a Ferrovia Madeira Mamoré, está abandonada. E pela mão de alguns incansáveis lutadores locais, que prefiro omitir para não fazer injustiça, pelo ânimo de ferroviários, ativistas e historiadores e pela consciência da Justiça Federal, se tornam vozes ainda ativas em prol da preservação de nossa memória.
Mas, mesmo assim, tempos negros houve por aqui, quando criaturas impatrióticas e sem escrúpulos queimaram um imenso acervo documental da ferrovia. Hoje, dela, nos restam alguns metros de trilho, algumas locomotivas e alguns registros. Mas sua vida íntima, o regaço de sua história, só poderíamos conhecer se tivéssemos esses papéis, montanhas de arquivos que foram incinerados por verdadeiras bestas transloucadas ou mal intencionadas, que levaram às cinzas uma das mais vibrantes páginas da epopeia sul americanas. Talvez, estas bestas feras tenham deixado filhos, que ainda tentam de alguma forma destruir nosso patrimônio através da omissão, sem políticas públicas para o resgate de nossa história.
Oficina lítica no rio das Antas em Rolim de Moura.

Outra obra de magnitude, não pelo fausto de sua aparência externa, mas por sua importância no contexto político nacional, e que hoje já quase não existe, é a linha telegráfica de Rondon.
Cabe ao historiador dar o grito de alarme e ir elaborando uma rota de trabalho cuja a espinha dorsal seja a descoberta e perfeita delineação daquilo que entendemos que deve ser preservado para o conhecimento das gerações vindouras.
E quando digo historiador, não me refiro aos memorialistas, não me refiro àqueles estereótipos de pesquisador sem técnicas, metodologias e vida acadêmica. É necessário levar a sério o patrimônio histórico e a profissão de historiador. O homem comum, ou não tem tempo, ou não tem interesse por essas coisas. Ou ainda, não têm capacidade mental para entender-lhes o valor. Mas as grandes obras da humanidade não foram idealizadas pelos homens comuns, em que pesem terem sido destruídos por ele.
Membros da Expedição Guaporé Objetivo no Forte Príncipe
Não nos tornemos homens comuns, e dentre eles, trabalhemos, no sentido de lhes emprestar razão suficiente para entender em que a pobreza de um passado, antes de mais nada e acima de tudo, significar que só nos aguarda um pobre futuro.

   
Aleks Palitot
Historiador reconhecido pelo MEC pela portaria n° 387/87
Diploma n° 483/2007, Livro 001, Folha 098

terça-feira, 19 de maio de 2015

Café com História


A estreia do projeto “Café com História”, uma realização do Colégio Objetivo e Faculdade Porto/FGV sobre os movimentos nativistas do Brasil foi um verdadeiro do sucesso. Em sua segunda edição, marcada para o dia 22 de maio, o evento vai comemorar os 150 anos do Marechal Rondon, importante personagem da história de Rondônia.
Serão trabalhadas questões do Exame Nacional do Ensino Médio (Enem) e vestibulares de todo o país, focando a abordagem que dão ao tema Marechal Rondon para o público de Ensino Médio e concursos. O evento conta com a participação de cinco historiadores do Colégio Objetivo e a presença de escritores e historiadores convidados que farão a leitura de alguns capítulos de livros.

“O Café com História terá uma edição especial que vai homenagear uma figura que é o patrono do estado de Rondônia, Marechal Rondon nos seus 150 anos de nascimento e inauguração de 100 anos das linhas telegráficas ligando a região de Rondônia ao restante do Brasil”, ressalta Aleks Palitot, professor de História do Colégio Objetivo e Introdução às Ciências Sociais e Políticas da Faculdade Porto/FGV.
Ao final, haverá sorteio de camisetas, canecas do Café com História e livros autografados pelos autores que irão palestrar. O Projeto é coordenado pelos historiadores Thiago Manso, Daniel Araújo, Rita Clara, Aleks Palitot e Ellen Regina.

Convidados
Ocampo Fernandes: Escritor e museólogo, escreveu sobre Rondon e fará uma participação de 15 minutos com sua versão e visão sobre Marechal Rondon.
Júlio Olivar: Escritor, jornalista e superintendente de Turismo. Júlio tem um livro chamado “Caminhos de Rondon” e trabalhará a temática sobre o personagem e a sua atuação em Rondônia.

Domingues Junior: Jornalista, escritor e diretor de Comunicação Social do Governo de Rondônia. Será o mediador e trabalhará a dinâmica da relação histórica com o personagem.
O evento é gratuito e aberto ao público interessado. Será realizado no auditório do Centro de Educação Executiva da Faculdade Porto/FGV, localizado na Rua Paulo Freire, 4767, bairro Flodoaldo Pontes Pinto. Mais Informações pelo telefone (69) 3211-6038

Assessoria de Comunicação
Grupo Pellucio

segunda-feira, 4 de maio de 2015

RONDON: O GRANDE CHEFE

“Rondon, esta alma forte que se interna pelo sertão, na sublime missão de assistir o selvagem”. Paul Claudel

Marechal Rondon ao lado de Aluízio Pinheiro Ferreira
“A tradição viva da verdade militante é que há de ser o Homero de vossas glórias”. Rui Barbosa
        Palavras parecem não ser suficientes para narrar a epopeia de um homem cidadão do mundo amazônico, que árdua missão assumiu para integrar este canto do mundo ao Brasil. São os “fios da história” que levarão ao povo brasileiro a possibilidade de descobrir o Brasil mais uma vez. Rondon não se limitou a erguer postes telegráficos e construir estações. Ele foi além da missão, ele foi ao limite do mundo até então desconhecido, e assim, permitiu que a nossa Amazônia fosse conhecida com mais propriedade, com mais riqueza de detalhes e permitindo que este mundo verde não apenas fosse de fato integrado ao país, mas o inverso, sendo assim, a construção das Linhas Telegráficas da Comissão Rondon, para nós um legado histórico fantástico deixado pelo suor, dedicação e alma de um verdadeiro cidadão brasileiro.
Visita ao túmulo do cientista e amigo.
“Tem na sola dos pés o mais longo caminho jamais percorrido”. Jaguaribe de Matos
          A idéia de colocar os estados da região Norte em comunicação com o resto do país já vinha sendo discutida desde o período do Império. Com a proclamação da República, o governo colocara em prática o projeto e criara a Comissão Construtora das Linhas Telegráficas. Para chefiar a quarta e última etapa da linhas telegráficas saindo de Cuiabá, Mato Grosso ao Amazonas entre 1907 e 1915 foi escolhido o homem certo para o lugar certo: Cândido Mariano da Silva Rondon.
Membros da Comissão de Construção das Linhas Telegráficas
“ A América pode apresentar ao mundo duas realizações ciclópicas: ao norte, o canal do Panamá. Ao sul, o trabalho de Rondon científico, prático e humanitário”. Presidente Americano Theodore Roosevelt
          O Tratado de Petrópolis assinado no dia 17 de novembro de 1903 deu ao Brasil o compromisso de construir a Ferrovia Madeira-Mamoré. Em troca, anexava-se ao Brasil, as terras que hoje formam o Estado do Acre, acrescentando mais, a necessidade de se colocar a região em contato com a capital do país. Por isso, a comissão Rondon teria a missão de ligar Cuiabá a Santo Antônio do Madeira e à região do Acre. A primeira etapa dos trabalhos seria o reconhecimento, a exploração topográfica da região por onde passaria a linha telegráfica.


Rondon na região do Araguaia
“ Começa, então, aquilo que com justeza poderíamos chamar de rondonismo, verdadeira escola que surgia inspirada nos mais profundos sentimentos de justiça e humanidade” Irmãos Villas Bôas

          Para executar o reconhecimento geográfico, Rondon dividiu o projeto em três etapas. Os trabalhos de cada etapa seriam executados por expedições separadas. Sendo as etapas: primeira com a expedição que executaria o reconhecimento de Cuiabá ao rio Juruena. A segunda expedição faria o reconhecimento do rio Juruena à Serra do Norte. A terceira partiria da Serra do Norte e atingiria Santo Antônio do Madeira.
Rondon e sua família
“Esse homem deveria receber o Nobel da Paz por seu trabalho de absorção das tribos indígenas no mundo civilizado sem o uso de armas ou violência. Ele é um filantropo e um líder de primeira grandeza” Albert Einstein 
          No ano de 1907 deram início aos trabalhos. A primeira expedição saíra de Cuiabá em agosto. Além de Rondon, compunha a expedição, o Tenente João Salustiano Lira, o farmacêutico Benedito, o fotógrafo Leduc e mais 12 pessoas, entre trabalhadores e soldados do exército. No dia 02 de setembro, a expedição partiu da localidade de Diamantino e seguira em direção a Serra dos Parecis e já no dia 07 de setembro, a expedição entrara em contato com os índios Parecis que já eram civilizados.
Comissão Rondon em 1907
“ A primeiro de janeiro de 1915 inaugurei, finalmente, na Câmara Municipal de Santo Antônio do Rio Madeira a linha Telegráfica de Cuiabá a essa vila, bem como o ramal de Guajará-Mirim” Rondon
         No mês de outubro, a expedição já se encontrara em território dos índios Nhambiquaras. No dia 20 de outubro, a expedição atingira as margens do Juruena. Ali próximo, havia uma aldeia dos Nhambiquaras e Rondon resolvera fazer contato com os índios, e assim o fez, mas acabou sendo flechado pelos mesmos. Mesmo sendo hostilizado, Rondon mantem a tropa segura, e não permiti que o alto grau de tensão, pudesse levar seus comandados a cometerem um massacre. Em suma, na visão de Rondon os índios defendem sua casa, a floresta.
            As operações da primeira expedição duraram 89 dias. Durante esses dias foram feitos reconhecimentos entre as regiões de Diamantino e o rio Juruena. No dia 29 de novembro de 1907, a expedição chegou ao povoado de Diamantino e em seguida, retornou a Cuiabá.
Comissão Rondon em 1907
 “Desde de muito cedo me empolgou o problema do brasilíndio. Expulso da terra, de que era legítimo dono, pelo invasor que viera, com mostras de paz, trazer sangue, ruína e destruição” Rondon

           A segunda expedição em 1908 era composta por 127 homens, todos armados, 90 bois cargueiros, 50 burros de cargas, mais 30 de sela, 06 cavalos, 20 bois para corte. A expedição percorreu o caminho anteriormente mapeado em 1907, em seguida atravessam os sertanistas o Rio Juruena e novamente são atacados pelos índios Nhambiquaras que naturalmente defendem sua terra. Mesmo assim, Rondon ali instalou o “Destacamento Juruena”, com 62 praças, sob o comando do Tenente Ferreira. Prosseguindo os trabalhos, finalmente Rondon chegou a Serra do Norte. Ali Rondon fincou o marco de 129 quilômetros.
         De todas as expedições, a última de 1909 foi a que mais dificuldade enfrentou. A expedição se caracterizou como uma verdadeira expedição de exploração e reconhecimento. O percurso a ser reconhecido era também o mais extenso. Por ele Rondon percorreu 1.100 quilômetros via fluvial e 1.200 via terrestre. Até então no mapa do Brasil o que hoje é o Estado de Rondônia era denominado de “Terras Desconhecidas”. Essa região tratava-se do espaço situado entre a Serra do Norte e a cidade de Santo Antônio do Madeira, hoje um bairro de Porto Velho.
        Essa última etapa dos trabalhos de reconhecimento, envolvia uma região onde as características geográficas praticamente, eram inexploradas. Daí também, a necessidade de serem feitos estudos envolvendo a parte do relevo, hidrografia, fauna, flora e solo da região. Consciente das suas responsabilidades, das dificuldades a serem enfrentadas, Rondon dividiu a expedição em duas turmas e denominou de “Turma do Norte” e “Turma do Sul”.

Comissão Rondon em 1914 - Forte Príncipe
“ Os trabalhos de reconhecimento e determinações geográficas, o estudo das riquezas minerais, da constituição do solo, do clima, das florestas, dos rios, caminhariam, pari-passos, com a construção da linha telegráfica, do traçado das estradas, do lançamento de futuras cidades, da instalação das primeiras lavouras e dos primeiros núcleos de criação de gado” Rondon
        O período de construção das Linhas Telegráficas em nossa região pela Comissão Rondon ocorreu entre os anos de 1907 e 1915, sendo inaugurada oficialmente em 1° de janeiro, quando Rondon profere um grande discurso enaltecendo o Brasil, o seu povo e a integração pelos fios do telégrafo. Lembrou também do trabalho de seus comandados que encaram o grande desafio de encarar a floresta amazônica sofrendo com as doenças, ataque dos índios e outros desafios que diariamente eram apresentados aos homens que ligaram essa região da Amazônia aos centros políticos do Brasil pelos “fios da história”.     
        


Aleks Palitot
Historiador reconhecido pelo MEC pela portaria n° 387/87
Diploma n° 483/2007, Livro 001, Folha 098