terça-feira, 27 de dezembro de 2016

Caravana FORD, uma aventura em Rondônia


Quando é que um acontecimento deixa de ser passado para começar a ser história? Será somente pelo número de anos decorridos, ou em cada caso haverá um tempo próprio, de acordo com a importância regional ou nacional de fato, com a existência do registro de informações que poderão ser examinadas e analisadas, ou quando a maior fonte de informações reside na memória e na lembrança dos que dele participaram, podendo a perda desses testemunhos dar lugar a versões que não corresponde à verdade?

Sem a pretensão de ser o dono da verdade, desejando apenas reavivar fatos que já vão ficando no esquecimento, e considerando a importância da BR 364 na vida econômica de Rondônia, como fator decisivo na criação das condições que permitiram a transformação do Território em Estado.
Os desbravadores que chegaram, no início da ocupação dessa terra ainda deserta da presença do homem não índio, e penetraram nas florestas em busca da castanha e da borracha, fundaram as primeiras povoações, construíram a Madeira Mamoré, rasgaram as primeiras trilhas terrestres e pelos cursos d’água atingiram as regiões do interior, foram os pioneiros e precursores de Rondônia de nossos dias.
Então veio a abertura da BR 029, num ato de ousadia e lúcida visão do presidente Juscelino Kubitschek, transformando Rondônia a partir daquele momento na maior frente de migração interna no Brasil e na mais próspera fronteira econômica do país.
Em uma reunião de governadores, levada a efeito nos primeiros dias de fevereiro de 1960, com o presidente da República, Juscelino Kubitschek, onde se faziam presentes os governadores dos territórios federais de Rondônia, Acre e Rio Branco (Roraima), além do governador do Estado do Amazonas, respectivamente Paulo Leal, Fontenele de Castro, Hélio Araújo e Gilberto Mestrinho, o coronel Paulo Leal, usando seus bons conhecimentos técnicos em engenharia, demonstrou ao presidente a necessidade de reiniciar a construção da BR 29. Para isto, chegou ao gabinete do presidente sobraçando grosso rolo contendo mapas e recortes de jornais, ao mesmo tempo em que contava com o apoio e entusiasmo de seus colegas da região. Juscelino ouviu-o. Como uma de suas metas era construir estradas para integrar o Brasil, ficou empolgado a ponto de determinar ao DNER a imediata execução dos trabalhos, mesmo por que pretendia inaugurar a estrada, antes do final do ano.
Mas a abertura da rodovia não fora suficiente, pois a mesma não era pavimentada, e se tratando da Amazônia e no seu período chuvoso, logo a mesma estrada de tantos sonhos, se transformara e uma rodovia de pesadelos, onde em determinadas épocas se levavam dez dias de Vilhena até Porto Velho, em virtude dos inúmeros atoleiros e pontes de madeira frágeis sob o efeito do tempo.
Mapa do roteiro da Caravana Ford em 1960.
No final de 1960, uma equipe formada com motoristas e mecânicos do governo, além de particulares, levou 59 dias de São Paulo a Porto Velho, conduzindo uma caravana de carros da FORD, chefiados pelo telegrafista Antônio Brasileiro, mais tarde substituído pelo mecânico Eduardo Lima e Silva.
Enfrentando o areião desértico, bebendo água de tambores, comendo conserva, enfrentando lama pelos picadões recém abertos, por tratores da Camargo Correia na floresta Amazônica; ou ainda, quando chovia, bebendo água coletada nos caminhões, ao mesmo tempo em que se banhavam na chuva, procurando mitigar o calor sufocante.
Na trajetória da caravana, somente encontravam tapiris e insetos em grandes quantidades. Na estrada que seria a Cuiabá-Porto Velho, também encontravam os índios que eram em bom número na região.
Entre alguns personagens interessantes entre tantos que participaram dessa aventura, fizeram parte o jornalista e diretor de cinema Manuel Rodrigues Ferreira que jovem naquela época fez inúmeras matéria sobre a caravana para jornais de São Paulo e do Rio de Janeiro, posteriormente acabou escrevendo a melhor obra sobre a ferrovia Madeira-Mamoré, o livro “Ferrovia do Diabo”. Também fazendo a cobertura da aventura durante um pequeno período o famoso jornalista Vladimir Herzog. Entre aqueles que ainda estão vivos para contar a história, temos o folclórico e carismático Sr. Gervásio que foi responsável pelas travessias dos caminhões em pontos de pontes e pinguelas que exigiam muita perícia, o mesmo reside em Porto Velho e em 2015 recebeu a Comenda Marechal Rondon, maior honraria do estado, por fazer parte de um seleto grupo de destemidos pioneiros de Rondônia.

Missão desse tipo exigia a escolha criteriosa e apurada de seus componentes, pois dificuldades para cumpri-la não iriam faltar. Chefe da expedição inicialmente, o chefe do gabinete do governador, Antônio Brasileiro, depois tivemos fazendo parte a importe figura história Eduardo Lima e Silva conhecido também como Dudu. A expedição também tinha como integrantes, o jornalista da Folha de São Paulo Hugo Penteado, o Coronel da Aeronáutica e naturalista Moacir Alvarenga, médico Carlos Fleury,  o mecânico da ford Sergio Zalawska, o jornalista  Álvaro Costa, cinegrafista Nestor Marques, José Araújo, Antônio Gervásio, Cordiel Firmino, Milton Luiz dos Santos, Benedito Cardoso, o empresário Roberto Casanave (representante da FORD em Porto Velho), Ireno Ribeiro, Raimundo Feitosa, Auzier Santos, Severino (cozinheiro), José Maria Saleh, Eduardo Lima e Silha filho e Antônio Costa Pereira.
A caravana Ford saiu de São Paulo no dia 28 de outubro composta por sete caminhões F-600, um trator e um jeep. Atravessando balsas e enfrentando a lama, ruindo pinguelas, abrindo variantes, até chegarem em Porto Velho no dia 28 de dezembro às 20 horas, sob aplausos de grande público e do governador Paulo Nunes Leal.

Aleksander Palitot
Professor e Historiador  

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