domingo, 29 de junho de 2014

GETÚLIO VARGAS E A ÚLTIMA CARTADA - 60 anos da Morte do Estadista


Vivo ou morto, Getúlio é o grande mito político da nossa história recente. Seu suicídio foi um golpe de mestre. Imobilizando os inimigos, ele possibilitou a manutenção da ordem democrática e a eleição de Juscelino, em 1955.
O suicídio de Getúlio Vargas, ocorrido há sessenta  anos, foi um acontecimento trágico e único na História do Brasil, razão pela qual vem sendo recordado e reforçado por múltiplos mecanismos da memória. Não fosse isso suficiente, o ano de 2014 também assinala os quarenta anos do golpe civil-militar de 1964, outro evento traumático da política nacional, que guarda com o suicídio um laço fundamental. Não só os analistas políticos profissionais, como também grande parte da população que tem acesso a informações, sabem e repetem que o suicídio adiou por dez anos o golpe. Ou seja, se Vargas não tivesse dado um tiro no coração, a conspiração que então se armava contra ele dificilmente seria evitada.


O segundo governo Vargas (1950-54) não transcorreu com tranqüilidade, tendo o presidente sofrido, sistematicamente, a oposição da maioria da imprensa e de grande parte dos setores políticos e militares, Mas, em agosto de 1954, uma grave crise se instalara com o atentado ao jornalista Carlos Lacerda, desencadeando um impasse de graves proporções, onde se opunham um presidente eleito, gozando ainda de grande popularidade, e uma ferrenha e aguerrida oposição militar, que acusava o governo, especificamente o próprio Vargas, de estar envolvido em um “mar de lama”. Tudo isso, é bom lembrar, tendo como cenário a Guerra Fria, que alimentava o medo dos comunistas e também dos sindicalistas.


A tensão chegou a tal ponto que a renúncia do presidente foi pedida, ficando claro que, se ele não se afastasse, seria deposto mais uma vez. Foi nessas circunstâncias que Vargas se matou, num derradeiro golpe político que visava reverter uma situação que vinha beneficiando os antigetulistas. Lançando sobre eles se cadáver, Vargas, como escreveu na carta-testamento, oferecia seu corpo em defesa do povo e da pátria, saindo da vida para entrar na história. Nunca se saberá o que teria realmente acontecido no Brasil caso Vargas não tivesse se matado.


Mas é certo que sua morte transformou o equilíbrio das forças políticas vigente, bloqueando o golpe que armava e possibilitando a manutenção da legalidade constitucional, com a realização das eleições para presidente, em que saiu vitorioso Juscelino Kubitschek. Importa assim ressaltar o “sucesso” imediato do suicídio para a manutenção da democracia no Brasil. Trata-se de uma excelente janela para adentrar à chamada Era Vargas (1930-45), e aí, particularmente, para se pensar nas razões que tornam possível a construção da figura desse presidente como um mito da política nacional.

Quando Vargas se matou, não era mais o chefe de um governo ditatorial, como fora durante o Estado Novo (1937-45), mas um presidente eleito pelo voto popular, em disputado pleito ocorrido em 1950. Sua vitória foi uma surpresa para os opositores, reunidos na União Democrática Nacional, a UDN. Estes acreditavam que um ex-ditador não poderia ser eleito, e, se o fosse, não poderia tomar posse. Tanto que questionaram as eleições e a consideraram, como frequentemente os derrotados fazem, uma prova cabal de que o povo brasileiro não sabia votar. O Povo, contudo, como evidencia a marchinha campeã do carnaval de 1951, “ Retrato do Velho” (“Bota o retrato do Velho outra vez, Bota no mesmo lugar, O sorriso do velhinho faz a gente trabalhar”. De Haroldo Barbosa Pinto), parecia não se haver enganado quando votou em Vargas para presidente. Foi esse mesmo povo, aliás, que saiu às ruas de várias cidades do país, em agosto de 1954, chorando e gritando, provocando incêndios e quebra-quebras, tudo para deixar claro seu apreço ao presidente morto e, mais uma vez, para assustar a UDN e os antigetulistas. Esses tiveram de fugir ou se recolher, reconhecendo a força do último golpe de Vargas: um golpe de mestre.
           
Aleks Palitot
Historiador reconhecido pelo MEC pela portaria n° 387/87
Diploma n° 483/2007, Livro 001, Folha 098

sábado, 21 de junho de 2014

Expedição Rondon-Roosevelt: 100 anos de uma aventura na Amazônia


Margem do antigo Rio da Dúvida renomeado por Rondon como Rio Roosevelt - 1914

Parte 1 – Estratégia

São muitos os questionamentos sobre tamanha façanha de um ex-presidente americano que se aventurou na região do atual Estado de Rondônia. Um homem habituado a tomar decisões que afetavam a vida de muitos compatriotas quando ainda era presidente da nação americana. Agora, em meio a grande floresta Amazônica, tal personagem teria sido reduzido a um encarcerado de uma prisão inglória com animais selvagens, povos indígenas, insetos e trilhas desconhecidas. As decisões que anteriormente eram tomadas na Casa Branca quando ainda era presidente do Estados Unidos, e afetavam diretamente o mundo através do Imperialismo Americano, agora definiriam a sobrevivência de um aventureiro que um dia fora poderoso, e na floresta será um simples mortal diante das surpresas que um ambiente selvagem e desconhecido lhe reservava.

Ex-presidente americano Roosevelt

Para muitos, Marechal Rondon teria sido vítima de uma ordenação e obrigação de acompanhar o Presidente Theodore Rooselvet na sua empreitada no vasto desconhecido da Amazônia. Com muita desconfiança e desconforto Cândido Rondon segue na missão de apresentar o “Eldorado Verde” ao celebre visitante. Desconfiança oportuna já que Rondon não se alegrava nos interesses e cobiça internacional pela riqueza da nossa floresta, ainda sendo o visitante o autor da política imperialista americana conhecida de Big Stick.
Enfim missão dada para Rondon será sempre claro missão cumprida. O grande personagem dos rincões da Amazônia será o guia do audacioso homem norte-americano que dizia não temer a floresta. Mal sabia ele as surpresas que lhe eram reservadas.

Análise dos mapas por Roosevelt devidamente protegido dos mosquitos
Paralelamente a organização da Expedição Rondon-Roosevelt a construção das Linhas Telegráficas na Amazônia iniciadas em 1907 pelo próprio Marechal Rondon, eram questionadas por autoridades e políticos brasileiros, devido seu alto custo. Somado a isso, Rondon tinha noção de que a construção da linha telegráfica provavelmente acabaria por estancar durante os setes meses e meio em que ele integraria a expedição. Justificaria em parte sua decisão mencionando a publicidade que sua participação nas atividades de Roosevelt traria para o projeto telegráfico. Acertara na sua posição, pois os jornais do Rio de Janeiro fizeram grande alarde em torno da expedição e das obras do telégrafo de Rondon por meses a fio. Além disso, a imprensa dera cobertura integral às conferências sobre a viagem que Theodore Roosevelt proferiu em junho de 1914 na Inglaterra, e também à publicação do relato de Roosevelt sobre a expedição.

Acampamento das Linhas Telegráficas - Rondon
Mas só a publicidade não concluiria a construção da linha. Por isso, Rondon voltou imediatamente ao noroeste do Mato Grosso (Rondônia) para comandar a arrancada final das obras.
Desde outubro de 1913, viajara até o Rio de Janeiro, voltara para Mato Grosso e conduzira a expedição de Roosevelt ao rio da Dúvida. Agora, voltava para terminar as obras, com o pensamento fixo na data da inauguração, que fora adiada para 1° de janeiro de 1915. Enquanto Theodore Roosevelt descansava em seu camarote no transatlântico, e depois em sua casa em Oyster Bay, Nova York, Cândido Mariano da Silva Rondon voltava a embrenhar-se na bacia amazônica para iniciar a fase mais difícil e crucial da construção do telégrafo.
Durante a Expedição Roosevelt era o comandante titular, e Rondon não tinha escolha a não ser respeitar a vontade do americano. Assim, recordaria mais tarde, respondeu a Roosevelt que estavam ali para acompanhá-lo e guiá-lo pela selva e que executariam os serviços de acordo com sua vontade. E concluiria que, por essa razão, o levantamento prosseguiu sem que pudessem obter todos os benefícios dos recursos técnicos que dispunham e com os quais haviam realizado um trabalho suficientemente exato e correto.
Roosevelt e Rondon

Ainda no Rio de Janeiro onde o presidente americano desembarcara, Rondon propôs ao Roosevelt a exploração do Rio da Dúvida em vez de uma simples caçada no noroeste brasileiro, e Theodore aceitou a proposta com entusiasmo. Rondon tinha quase certeza de que esse rio desaguava no Madeira, mas seu curso ao norte nunca fora mapeado ou explorado, o que explica seu nome. Para chegar ao rio, a expedição primeiro partiria do posto de abastecimento da comissão em Tapirapuã até a linha telegráfica em Utiariti. Em seguida, os homens acompanhariam a linha telegráfica por aproximadamente 250 quilômetros até as cabeceiras do Rio da Dúvida. Esse novo e decididamente itinerário preocupou o ministro das Relações exteriores, Muller, que alertou Roosevelt sobre os perigos. Afinal, durante a jornada o presidente completaria 55 anos.

Acampamento da Expedição - 1914

Durante a aventura na Amazônia de Rondônia, os insetos e as doenças estarreceram os americanos. Nuvens de praga exasperavam os homens. Borrachudos, abelhas Lambe-suor e maribondos picavam-nos por cima dos chapéus e das luvas. Carrapatos cobriam-lhes as roupas. Formigões de três centímetros de comprimento tinham uma ferroada “parecida com a de um escorpião pequeno”, Roosevelt reclamou.

Roosevelte em Conferência Científica na Inglaterra - 1914
Em 26 de abril de 1914 o exausto grupo aproximou-se da confluência dos rios Aripuanã e Dúvida. Rondon rebatizara este último com o nome de Roosevelt. Ali as bandeiras do Brasil e dos Estados Unidos tremularam no alto do acampamento comandado pelo tenente Pirineus de Sousa. Em 59 dias, os membros da expedição haviam percorrido cerca de 640 quilômetros. Tolhidos pelas corredeiras, haviam levado 48 dias para avançar pelos primeiros 270 quilômetros. Agora, bebiam e banqueteavam com a comida que o grupo auxiliar do tenente Pirineus lhes trouxera.


Em 30 de abril membros da expedição foram a Manaus via Rio Madeira, e ali médicos brasileiros providenciaram tratamento para uma das pernas ferida de Roosevelt.
Rondon voltou ao Rio de Janeiro no início de 1915, foi aclamado por seus esforços tanto na expedição Rondon-Roosevelt e na construção das Linhas Telegráficas e, para platéias lotadas, fez conferências empolgantes sobre as heróicas realizações da comissão.
    

Aleks Palitot
Historiador reconhecido pelo MEC pela portaria n° 387/87

Diploma n° 483/2007, Livro 001, Folha 098